A única certeza que temos nessa vida é que todos nós vamos morrer. Cedo ou tarde, ela chega para todos nós, e o que nos torna completos é o que fazemos pelo caminho que percorremos até que esse momento chegue para a gente. A ordem natural dos fatos é que os filhos pereçam depois de seus pais, e que todas as pessoas cheguem até uma idade avançada, desfrutando de décadas de vida e contribuindo para a sociedade ao longo de sua jornada. Para algumas pessoas, porém, esse caminhar é interrompido mais cedo, como podemos ver em ‘Enquanto Vivo’, novo drama francês que foi exibido no Festival de Cannes e no Festival Varilux de Cinema em 2021 e que chega essa semana aos cinemas de todo o país.
Benjamin (Benoît Magimel) é um homem na faixa dos quarenta anos que acaba de descobrir que tem um câncer em estágio 4 e não tem cura. Apesar disso, ele tanta não ser pessimista com relação o assunto, embora sua mãe, Crystal (Catherine Deneuve) esteja alarmada com a situação. Ele tem entre seis e doze meses de vida, mas não quer ficar desperdiçando seus dias se lamentando: ao contrário, quer dar suas aulas de teatro até quando puder, ajudando seus alunos a atingirem seu melhor potencial e conseguirem entrar no conservatório. Para isso, ele conta com a ajuda do carismático oncologista, Dr. Eddé (Gabriel Sara) e de sua assistente, Eugénie (Cécile de France), que irão lhe dar forças para atravessar o período sombrio do tratamento com menos tristeza e mais amor.
Longe de ser um ‘Patch Addams’, este drama francês foca na intensidade com que nós nos agarramos às nossas vidas, e no quanto podemos nos tornar pessoas melhores nem que seja em nossos últimos momentos de vida. Assim, o roteiro de Marcia Romano com Emmanuelle Bercot parte de um personagem comum, de certa forma até irritadiço e pouco agradável para o público, para, aos poucos, ir descascando-o diante dos nossos olhos, desarmando-o de todas as barreiras levantadas em prol da autoproteção de modo a enfim mostrar que, nus, somos todos frágeis diante da morte.
Ainda que o tema central seja a inevitabilidade da morte, ‘Enquanto Vivo’ não é exatamente um filme triste, ao contrário, busca iluminar este tema cujo tabu nos impede de refletir abertamente. De modo a construir esse cenário, o diretor Emmanuelle Bercot foca o seu longa na transformação de seu protagonista, que perpassa desde as mudanças evidentemente físicas quanto – e principalmente – as alterações emocionais e psicológicas, que são, provavelmente, o maior entrave para as pessoas que precisam encarar esta realidade. Benoît Magimel entrega toda a sua energia a este papel, conseguindo alcançar o verdadeiro apagar da chama da vida. Mereceu os prêmios que levou.
Sensível e intimista, ‘Enquanto Vivo’ é um filme reflexivo em tempos em que vida e morte andam tão instáveis nessa gangorra da realidade. Para o bom cinéfilo que gosta de praticar a empatia cinematográfica, colocando-se no lugar dos personagens, ‘Enquanto Vivo’ é uma boa opção para discutir sobre o tabu da morte sem sair da sala de cinema com o clima pesado. E ainda traz a icônica Catherine Deneuve de volta às telonas.